sexta-feira, 1 de março de 2013

A história de uma leitora, um motorista e uma tagarela.

A menina pegou o ônibus por coincidência. Era um ônibus que podia pegar, mas nunca tinha um horário fixo para voltar para casa e tinha várias outras opções de condução.
Era um "Capela do Atuba", que lhe remetia à histórias engraçadas que preferia esquecer. Gostava especialmente daquele ônibus, nunca ia mundo cheio e sempre conseguia sentar antes da catraca (seus lugares preferidos).
Estava um pouco irritada, o ônibus estava parado bem antes do local onde deveria, desligado, e o motorista estava fora dele. Apenas dez minutos depois que o motorista retornou ao seu posto e os faróis se acenderam para buscar os viajantes. A menina entrou.
Sentou em seu local preferido, logo na frente da catraca e com apenas um lugar na frente, ao lado do motorista.
Ao mesmo tempo que abriu a mochila para deixar de ser "a menina" e se transformar "na leitora", uma mulher entrou no ônibus.
- Boa noite, Carlito! - A mulher cumprimentou o motorista. - Tá adiantado de novo?
O motorista, Carlito, estava mexendo na tela da URBS ao lado do volante, e deu um sorriso meio constrangido.
- A URBS me mandou uma avaliação falando isso agora mesmo. Se eu chego atrasado eles reclamam, se eu chego adiantado eles reclamam!
- Ai, Carlitos, só você mesmo, haha!
A leitora tentava ignorar os sons ao seu redor, mas mal imaginava que a frase "ai, Carlitos, só você mesmo, haha" seria dita praticamento por toda a viagem.
A viagem foi tensa para a leitora. A conversa fluia entre o motorista envergonhado, a tagarela que fala o nome "Carlito" ao fim de cada frase e a mente da leitora, que tentava se desligar do mundo exterior.
Meia hora depois, a leitora fechou seu livro e saiu do ônibus rumo à vida real.
No dia seguinte a menina pega o ônibus por coincidência. Não possui horário para voltar para casa e aproveitou que ele já estava a vista: Parado antes do ponto, desligado, com o motorista fora. Capela do Atuba.
Ao entrar no ônibus sentou-se no mesmo lugar que o dia anterior. O motorista notou a leitora, que notou a tagarela, que notou o motorista:
- Boa noite, tá adiantado de novo, Carlito?

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