Quando eu era adolescente fui uma das últimas pessoas da minha bolha a ganhar um celular, aquilo era uma novidade imensa pra mim, era um tijolinho com zero atrativos mas eu tava super feliz porque aquilo que todo mundo já tava acostumado era uma puta novidade para mim, então eu queria pegar o número de todo mundo (mesmo que eu nunca tivesse crédito), queria mostrar o jogo (no singular), tava deslumbrada. Minhas amigas acharam ruim, falaram que já tava chato, que eu não parava de falar disso, e aí eu me calei, não queria ser a chata.
É uma parada boba para lembrar agora, mas, querendo ou não, fala muito de mim. Eu estava feliz com algo, fui criticada e engoli minha felicidade, me calei, minha felicidade incomodou e abri mão dela. Era algo bobo para as outras pessoas, mas não era algo bobo para mim, não importa que seja, no final das contas, uma besteira, eu não garanti minha felicidade pelo medo do que iriam pensar, eu ainda não tinha diagnósticos e nem sinal visível da minha ansiedade, mas ainda tomei essa decisão, um exemplo entre tantos outros.
Esse final de semana que passou foi um resgate a várias coisas do meu passado. Saí de casa, o que é raro, para encontrar uma das pessoas que mais me conhece nesse mundo, não das que acham conhecer, uma que realmente me conhece, e ela me jogou (com muito amor) várias verdades na minha cara, coisas que em seis sessões de terapia ainda nem foram remexidas, coisas que eu preferia fingir que não guardo, mas guardo, e foi bom ouvir isso.
Um lado de mim queria que todo mundo olhasse as coisas que passei e validassem: não é justo, não foi justo. Talvez porque eu tenha essa capacidade com os outros, vejo as pessoas sofrendo injustiças, maioria social, e sei que elas não deveriam estar passando por aquilo, validar não faz com que parem de sofrer, mas as vezes é bom que alguém chegue para nós e fale: ei, eu vejo razão para o seu sofrimento, porque nós somos ensinados a agir como loucos, viver como loucos, ignorar tudo aquilo que sentimos e tudo aquilo que dói, ignorar essa dor interna, inclusive, é sinônimo de amadurecer. Essa fragilidade (ou honestidade), essa vulnerabilidade às nossas dores do passado, tudo isso é considerado fraqueza, eu não vejo mais assim, mas sei que é visto assim, sou parte do mundo mas não sou o mundo todo.
Minha mente vai bem, obrigada. Eu saí de casa e tive que lidar, por umas duas horas, com os sintomas de sempre, aquela sensação de que vou vomitar, vou desmaiar ou explodir, aquele aperto e vontade de chorar, mas não o coração, dessa vez ele bateu no ritmo normal, é algo a se agradecer, um sintoma a menos. É chato, sabe, é chato porque, mentalmente, eu me sentia ok. Sabia que ia sair, queria sair, sabia que talvez passasse por alguns eventos físicos, sabia que teria que lidar com isso. Mas me enche pensar que eu vá ter que lidar com isso para sempre, será? Será que, sempre que eu sair de casa, vou precisar andar com uma sacola plástica na mão, caso vomite? Será que vai ser sempre tão cansativo?
Eu não estou mal, pelo contrário, tô mais consciente das minhas vitórias, eu consegui ir, afinal, eu sobrevivi. Mas o peso é grande, a vergonha e a falta de confiança, eu não quero que o mundo me valide, eu só gostaria de ser minimamente entendida, mas é um erro esperar isso, ninguém vai ver a validez na minha dor porque ninguém tá vivendo o que eu vivo, isso não quer dizer que eu não possa me afagar. Não quero viver como uma vítima de mim mesma, mas quero ser capaz de me olhar no espelho, fazer um afago com os olhos e dizer para mim mesma que não importa se ninguém vê o tamanho do peso que eu carrego, importa que eu sei o quanto eu me supero a cada dia, esse peso não me define, talvez (espero?) nem seja parte de mim por muito tempo, quem sabe? Talvez, em algum momento, eu possa sair de casa e ver as pessoas que eu amo sem nem sentir ânsia ou sensação de desmaio. Já foi assim, talvez um dia volte a ser.
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