segunda-feira, 22 de julho de 2019

provadores

- A pior coisa é um artista com medo. - Eu disse na frente do espelho, ele me fitou de volta.
- Por que diz isso?
- Veja bem, o artista sempre apresenta uma ideia, certo ou errado, bom ou mau, sempre tem algum conceito envolvido. Mas e o artista que não tem segurança de si? Ele vai criar, porque isso é inerente, mas nunca vai divulgar. Vai ter medo de mostrar o que pensou.
Meu espelho me fitou com um olhar engraçado.
- Como alguém pode ter medo da própria criação? - Perguntou e eu ri, sendo acompanhado pelo reflexo envergonhado.
- É fácil, na verdade. Estamos sempre nos destruindo e reconstruindo, é fácil olhar algo do passado e não se ver mais ali.
- O que é diferente de negar a própria arte.
- Não é tão diferente assim. Se eu ficar famoso por uma obra que na época fazia sentido mas hoje em dia está ultrapassada, bom, ficarei conhecido como ultrapassado.
O espelho soltou um muxoxo de descrença.
- Não acho que as pessoas pensem muito nisso.
- Mas é aí que está, o artista pensa, o artista gosta de refletir sobre aquilo que ninguém mais reflete. Só que quando ele gera essa reflexão, bom, as pessoas que nunca tinham pensado sobre passam a discordar dele.
- Mas o papel não seria exatamente gerar a reflexão, e não a ideia pronta?
Andei pelo banheiro até encontrar o barbeador, só então respondi.
- Não, acho que isso é ilusório. Todo mundo tem uma ideia pronta, a gente pode até mudar, mas imparcialidade é uma mentira.
- Isso tudo parece papo de maluco.
- De maluco não, meu amigo. De artista.

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