sábado, 12 de maio de 2018

X

Era um festa muito louca, todo mundo presente, umas comidas gostosas e muita gente embriagada. Eu andava de roda em roda, conhecendo desconhecidos, revendo amigos, procurando os parceiros que vieram comigo. Vi um deles de relance, tava sem camiseta e usando um sutiã branco, notavelmente muito bêbado. Suspirei e fui para fora fumar um tabaco.
A festa parecia estar acabando e muita gente esperava o chuvisco acabar, sentados na escadaria de degraus grandes, para poderem ir embora. Olhei para cima, sentindo as fracas gotas de chuva no rosto, e depois para baixo, arrependendo-me de ter deixado minha mãe - sentada em algum lugar lá dentro - ter escolhido minha roupa. As nuvens pareciam estar indo embora, constatei, e algo na parte mais aberta do céu me chamou a atenção. Um punhadinho de luzes bem próximas uma das outras, cada uma com intensidade e cores diferentes, embora nenhuma fosse muito grande. No topo delas, quatro luzes formavam um padrão de cruz que eu já tinha visto inúmeras vezes no céu. Algo piscou forte e tudo mudou rapidamente. Cada minúsculo pontinho brilhante se moveu em uma direção, formando algo que me remeteu à luzes de um aeroporto, vistas de baixo. Em uma parte do desenho celeste, algo como uma pista de pouso, e o movimento de tudo aquilo me deixava meio zonza.
Ninguém mais parecia ter visto, e avistei a nuca de um amigo um pouco à frente. Corri até ele e apontei, tentando manter a voz em um tom controlável.
- Cara, olha isso.
A expressão dele mudou, como se entrasse em transe, e outras pessoas repararam no meu gesto e seguiram o movimento.
Algo invisível se chocou contra a formação luminosa e vários pontinhos menores explodiram em pedaços. Algo na minha cabeça apitou. Nunca havia considerado a ideia de alienígenas como algo perigoso, mas uma compreensão se espalhou pela minha mente: eles estavam nos defendendo de algo.
- São... são naves? - Uma mulher idosa sussurrou atrás de mim, todos ao redor com um semblante assustadoramente calmo, como se estivessem dopados.
- Oi, pessoal, fiquem calmos. Vocês estão seguros. - Uma voz masculina e tranquilizadora ressoou em todas as cabeças, mas a curta risada nervosa que ouvi no final da frase me contava que não estava tudo tão bem assim e, como para confirmar minha opinião, outras naves desabaram, vítimas de um ataque silencioso. Dessa vez os destroços cairam na quadra em que estávamos e alguém gritou de forma absurdamente controlada, o olhar de quem não estava presente:
- Procurem abrigo!
Saí correndo, obrigando meus pés a encontrarem sentido no chão, e meus pensamentos corriam em direção à todas as pessoas que eu deveria encontrar, com foco no meu parceiro -visto mais cedo com o sutiã e aspecto bêbado dando em cima de um menino louro. Eu sabia que, juntos, a gente poderia ter alguma utilidade para a situação. Não fazia ideia do quê, mas corri, a direção não importava muito.
Acordei no meu quarto, luzes apagadas e a sensação de que ele estava cheio de gente, gente preocupada comigo, como um leito de hospital. Meu coração palpitava furiosamente e eu estava com um medo irracional de encarar a janela e acabar enxergando alguma luz lá fora. Acordei meu companheiro e contei tudo. Centenas de vozes enchiam minha cabeça e diversas sensações passaram pelo meu corpo, e eu sabia que, seja lá o que fosse a multidão invisível em meu quarto, eles sentiam culpa. Soltei algumas risadas nervosas e fiz piadas dramáticas em voz alta, apenas para cortar um pouco do nervosismo e da tensão presente. Eu não estava brava, exatamente, só assustada e incapaz de olhar pela janela. Não queria que pensassem que eu preferia não ter passado por isso, ainda mais depois de tanto tempo pedindo para acabarem com o bloqueio que eu mesmo tinha colocado. Mas o medo, aiai, o medo é a barreira mais difícil de avançar, e mesmo com ganas de meter o pé na porta que leva ao abrir de mentes, o palpitar do coração me lembra que eu sou pequenininha, pequena demais. Ainda.

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