quarta-feira, 22 de outubro de 2025

Rodeada pela morte

 No domingo o Aurélio foi morto pela polícia. Eu poderia suavizar as palavras, mas nunca foi do meu feitio e a realidade é essa: no domingo, último, Aurélio foi morto pela polícia. Com três tiros. Na própria casa. 

É tipo mais um dos medos realizados, dos milhões desse ano (o que, acharam que não seria mais um texto sobre mim? Respeitem meu local de entendimento, por favor). Eu perdi minha mãe, perdi meu gato mais "meu", perdi uma prima, um tio de consideração, um amigo da família, meu escritor preferido, em 2025 muitas das pessoas que eu amava perderam a chance de continuar por aqui, a maioria delas sei que queria mais anos. E, domingo passado, perdi o Aurélio, um dos amigos de Matinhos que nunca questionei a amizade, alguém que vi depois de sair de lá, que fez questão de me ver. Falei com ele semana passada, sabe?

A morte da minha mãe me traz raiva, mas eu não encontro culpados. Na morte do Fora-da-Lei eu só consigo culpar a mim. Quando Iago me falou, logo depois do horário da minha terapia (também conhecido como 'horário em que tudo dá errado'), que Aurélio morreu, a primeira coisa que pensei foi "caramba, eu achava que ele tinha vencido o câncer!". E tinha, eu não estava errada. Eu lembro de, mesmo de longe, acompanhar que ele estava de cama, morrendo de dor, vivendo à base de morfina legalizada até liberarem a cirurgia que ele precisava. Liberada, ele reviveu, e nisso veio essa minha falsa segurança de que ele estava fora de perigo.

Só que eu esqueci que eu vivo no planeta Terra, país Brasil. Esqueci que ele vive em uma cidade minúscula, com forte coronelismo, num país racista quando convém (e geralmente convém). 

E é isso que eu não engulo. Um cara com a história dele, com o caráter dele, vi otário no Facebook "ain porque Aurélio quando era morador de rua em 1986 (!!!) era cuzão", velho, um foda-se do tamanho do mundo, eu conheci o Aurélio do presente, o que eu gostava de falar "ah, mas tal opinião é porque você é chato, né, Aurélio (risos)" e ele levava na boa. Eu tive tanta dificuldade em me expressar e entender os outros em Matinhos, ele era uma das pessoas fáceis de entender, ele comunicava o que pensava, sem joguinho, sem tentar ofender ninguém, mas certo da sua opinião. Levou isso até o fim, um viciado em cuidar de animais (elogio dramático) que morreu tentando proteger um bicho que não era nem dele, o único que, desde que o conheço, morreu sem conseguir salvar. 

A morte me dói sempre por tudo aquilo que foi tirado de quem se foi. Partida natural ou não, acho meio inevitável não pensar no quanto quem se foi gostaria de ver ou viver tal coisa. Penso nisso todo dia em relação minha mãe e, desde domingo, sobre Aurélio. 

Se eu pudesse falar algo para ele, diria que a Cler e mais amigos que ele fez em Matinhos garantiram a segurança dos bichos dele. Diria que sinto muito não ter respondido todo e cada vídeo de internet mandado, mas que agradeço ter falado com ele há duas semanas. E agradeço que ele cuidou da Bolota quando, se não fosse ele, ela morreria na nossa mão, independente de qualquer boa intenção. Agradecer os jogos de xadrez e que ele nunca se incomodou com meu jeito de ser, mesmo quando eu era implicante e dava bronca, coisas que faço com gente que gosto. 

Foi legal quando a gente se encontrou no MON, em Curitiba, num contexto fora de Matinhos, ele estava no tratamento, vivia sentindo dor e, embora falasse sobre isso, era sempre com um sorriso no rosto, um negócio genuíno. Acho que é a palavra que me remete ele, é uma das qualidades que mais admiro: Aurélio era genuíno. 

Eu vou sentir sua falta, amigo, de verdade. Mesmo longe, era feliz de saber que compartilhava o mundo com você. Você foi arrancado de muitos de nós, não consigo nem imaginar como está a cabeça do pessoal de Matinhos que vivia contigo dia a dia. Você vai fazer muita falta, o planeta é um lugar pior agora. De novo. 

Se existir algo depois da vida, espero que você esteja bem, espero que esteja se sentindo amado e acolhido. Fico pensando nos seus últimos segundos, é quase tortura, mas não consigo evitar. Você devia estar amedrontado, Aurélio, eu sinto muito, muito, que você tenha passado por isso. Se ainda estiver com a gente de alguma forma, então essa mensagem, qualquer mensagem, preciso acreditar que possa chegar até você. Senão, não importa mais, tudo se trata de, mais uma vez, engolir o luto, honrar sua memória e tentar evitar os próximos enquanto as lágrimas ainda caem. 

Vai em paz, amigo, deixa a guerra com a gente. Sinto muito, de novo, pela sua forma de partir. Nunca vou te esquecer.

sexta-feira, 17 de outubro de 2025

Escrevendo para entender

O tempo está passando e, mesmo que eu também esteja me movimentando, a sensação é de que tudo ainda é uma junção esquisita de realidade e sonho. 

Faz tempo que não escrevo aqui, mas não quer dizer que andei parada. Na verdade, em relação à escrita, tenho até tentando "aquecer", me propondo alguns exercícios e tentando cumprir.

Sinto que o ano está acabando, porque ele está. Um ano que comecei com minha mãe e terminei sem. Na verdade (Facebook me lembrou há uns dois, três dias), há um ano ela estava pintando a mandala na parede externa da própria casa, a mesma que hoje virou uma Poke Parada (?), algo bobo, mas que me deixa feliz, de alguma forma ela pintou algo sem expectativa e alguém de fora notou, registrou. Acho isso legal. 

Nesse ano perdi minha mãe e meu gatinho Fora da Lei, o meu linguinha de fora. Foi um ano difícil. Foi um ano difícil.

Ao mesmo tempo, tanta coisa boa aconteceu, num nível que se eu listar vou esquecer várias. Sempre senti a existência como ciclo, morte e vida, não faço ideia do que estou fazendo aqui, mas, com a morte da minha mãe, naquela relação de muito amor e ódio do tamanho desse amor, meus maiores medos se concretizaram, todos aqueles que deeeesde criancinha tentei abafar. E eu ainda estou aqui, tropeçando, aprendendo. 

Acho que não tem como fugir de alguns clichês. A vida é movimento porque acaba, a morte impulsiona a vida, tanto faz, a grande questão é, hoje, que já já pode mudar: minha mãe morreu, eu sofro, mas continuo, só que continuo mais esperta, corajosa e, principalmente, salafraia (adoro essa palavra).

Tenho muito para dizer, mas entrei num caminho que não me sinto à vontade de expôr aqui, que é triste, porque sempre foi aqui onde escrevi para definir o que eu acreditava ou não. 

Fica para a próxima, então, online ou offline. Tchau, amiguinhos!!! 

segunda-feira, 16 de junho de 2025

Dias corridos e um adeus para minha mãe

 De sábado para domingo dormi no hospital, minha mãe estava sofrendo muito e preferiu ir para lá. Domingo de manhã voltamos para casa, mas hoje, logo após a terapia, voltamos para lá com a notícia na mente, ela está partindo.

Foi um luto de dois anos. Foi um luto mesmo quando eu via ela, durante a quimioterapia, pintar DOIS muros e andar diariamente 5 da manhã na praia durante 10km. 

Eu sei que estou na fase "raiva" do luto e também sei que ela não é muito justa porque, verdade seja feita, desde o diagnóstico tivemos muitas e muitas histórias para aproveitar. Vivemos esses dois anos intensamente. O que não me tira da cabeça que ela tem apenas 61 anos, foi natureba a vida inteira, alimentação impecável, buscava se exercitar, enfim, eu não como arroz integral hoje porque minha mãe nos enjoou disso na infância, haha.  É de ficar brava que ela esteja partindo tão cedo, embora eu tambéééém saiba que a morte não é questão de merecimento, ela só acontece, para minha mãe, para recém-nascidos, bebês, crianças, para pessoas horríveis e pessoas maravilhosas e, um dia, para mim também.

Desde criança penso nisso e, como meu apego por essa coroa teimosa é indescritível, sempre meio que torci em partir antes dela (o que é meio egoísta da mesma forma, porque ela não ia querer isso, mas eu era adolescente e adolescente tem direito de ser burro).

Eu amo a minha mãe e já esgotei as formas que conheço de falar isso. Escrevendo para vocês aleatórios e falando para ela, lúcida ou dormindo, antes ou agora. Depois de dois dias acompanhando ela no hospital, sofrendo sempre que acordada, estou cedendo o lugar para minha irmã que mora longe e está vindo, para minha irmã caçula, que talvez agora consiga um tempo para elaborar uma despedida, para meu pai, o último romântico e, em um campeonato injusto de sofrimento, com certeza o que vai mais sentir essa falta. Embora eu saiba que ele é capaz de seguir em frente, também é quem mais me preocupa, porque ele viveu uma felicidade a dois por muitos anos e agora vai ficar sozinho. Filha de romântico, romântica sou, então me compadeço. 

E eu vou perder minha mãe. Aquela que eu reclamei por anos nesse blog, com ou sem razão, e que elogiei muito também, dessa vez sempre com razão. Minha mãe que nunca foi perfeita, só Mônica, que por acaso é minha mãe. Como ela sempre disse.  A que abdicou do maior salário porque teria que alinhar com ideologias que ela era contra. A que, comigo na barriga, fez uma matéria com aqueles pilotos que desligam o avião lá em cima e mandou um "oh, tu não me mata que eu tô grávida". A que prendeu um pedófilo só com o poder da investigação; a que entrevistou mulheres trans para dar voz numa revista quando pouquíssimos faziam isso; a que me chamava para contar um segredo e arrotava na minha orelha. Também quem me passou o primeiro trote. 

Minha mãe soube viver. Viveu como quis, aguentando críticas de todos os lados, e, embora certamente devesse ter olhado mais para si do que para os outros, também soube ser uma amiga incrível para os que tiveram estômago para se aprofundar por sua maneira de falar o que pensava e sentia. Mudou muito, evoluiu muito, sempre foi corajosa o suficiente para deixar de lado aquilo que já não fazia sentido. 

Minha mãe vai morrer brava de estar morrendo, igualzinho o pai dela, Vô Darcy. Ela vai ter mais razão em seus sentimentos, porque vovô foi até uns 90 e tantos, mas sei que ela com 100 iria querer mais 10 anos e assim em diante. Acho que nada prepara para a morte? Pelo menos é o que penso hoje. 

E, com certeza, nada prepara para a morte de alguém que a gente ama. Eu não sei o dia de amanhã, algo que, particularmente, não gosto. Não sei como a vida vai seguir agora, só sei que vai seguir, porque se tem algo que eu acredito é que a melhor forma de honrar os mortos é viver.

Até agora e até onde eu sei, o corpo da minha mãe ainda está entre nós, com ele algumas partes de sua mente, talvez o suficiente para se despedir das minhas irmãs e do meu pai. Eu vou conversar com ela após partir, com cuidado para não estragar as aventuras que quero acreditar que ela terá,  mas o máximo que posso fazer agora é lembrar desse sentimento tão forte que nos une.

Te amo, mamãe. Parta tranquila, ficaremos bem.  

 

 

 

sexta-feira, 13 de junho de 2025

Muitos 13

 Muita correria e pouco tempo para qualquer coisa.

Terminei o primeiro semestre de jornalismo (pela terceira vez), foi bem de boas até então, mas reza uma lenda de que no terceiro semestre o bicho pega. Tanto faz, problema para a Lua do futuro.

Minha mãe melhorou, aí piorou de novo, hoje estive lá e não foi um dos melhores dias. Mas ela ainda está aqui, então a gente não sabe o que o futuro reserva, mas ainda há futuro. 

Hoje foi difícil, tive vontade de chorar enquanto estava lá, não sou de segurar choro, mas fiz. Não vou descrever algo que prefiro não registrar mentalmente (esse lugar serve para isso também), eu lido com muita coisa, mas não consigo lidar com o medo de alguém que está morrendo. Principalmente alguém que, se vivesse 400 anos, gostaria de ter mais 100. 

Eu não estou infeliz e nem totalmente apática, um pouco no automático, sim, mas não apática. A depressão conversa, mas não tem me impedido, embora sempre fique uma dúvida de quanto tempo isso vai durar.

Eu não ando querendo conversar, mas, quando quero, meus amigos estão bem disponíveis e eu agradeço internamente (e por aqui e às vezes para eles, talvez menos do que deveria). Não tenho sido a melhor das amigas e ainda assim eles têm sido muito compreensíveis.  

Cansei de escrever porque não quero escrever o que estou pensando. Vou ser esperançosa e dizer que dias melhores virão, porque, na verdade, virão mesmo.  

domingo, 11 de maio de 2025

Dia das mães

 Mamãe tem os dias contados e não fazemos ideia de quanto tempo isso significa. Estamos todos prontos para passar por isso e, ao mesmo tempo, se ninguém sabe do futuro também podemos ser esperançosos. 

Hoje, dia das mães ou, como dizemos em japonês (piada interna kkkkk) hahanohiwa, encontrei boa parte de quem considero família. Minha mãe tá engraçadíssima, passo a entender de onde surgiu mesmo sendo de humor absurdamente mórbido. Ela é foda. Minha mãe é humana, naturalmente, ela tem medo da morte, do desconhecido, do resto, quem não tem? Mas a bicha é foda. Simplesmente.

Cronologicamente falando, minha mãe trouxe uma família que eu nasci sabendo que era família, mas igualmente sabia não ser de sangue. Nunca liguei para isso, sangue, minha família de agora é a mesma da infância. 

Tenho muito para falar sobre isso mas cansei.

Amo minha mãe. Amo meu pai. Todas as minhas irmãs são mto daora. Minha família sabe quem é, fui avisando aos poucos "oh sangue é fodac para mim, vcs são minhas família superem".

Mas eu gosto dos dias que provam isso. Feliz dia das mães para minha mamãe engraçada, vovó, Kaká, Sheila, Fafá, Bela, Lulu e tvz até eu, vai que o futuro me dá um filho (se isso acontecer ele já está vivo)

quarta-feira, 30 de abril de 2025

Antes que Abril se vá

 Acabei de terminar o livro da Célia, enviei há uns minutos, o prazo terminava hoje mas para quem crê em deus nada é impossível (isso é uma tremenda duma piada pq eu fiquei dias escrevendo até a bunda doer)

Com certeza não sou acostumada a finalizar coisas, tô aqui na primeira cerveja pensando no e agora. Estou feliz, meio incrédula, querendo reforço positivo e contando pra todos meus amigos hihihih

Além disso, nessa semana comecei os simulados das matérias da faculdade, terminados vem as provas e então fim de matéria, sigo pras próximas. Gosto de ver a vida caminhando. 

Não vou me estender mto pq escrevi demaaaaais nos últimos dias, só quero registrar aqui que sim, às vezes eu termino coisas!!!!

quinta-feira, 3 de abril de 2025

Inspirações

 Eu poderia falar sobre como a vida tá mostrando vários caminhos e eu tô tentando aproveitar todos, mas, na verdade, hoje quero escrever como, cursando pela terceira (🙄) vez jornalismo, tenho uma inspiração de trabalho, na prática, que gostaria de fazer. Não sei o quanto a vida vai me permitir escolher, se escolhesse escolheria você. Você, seu careca sagaz que aprendeu a ganhar a vida se divertindo mesmo quando tá de saco cheio: Chico Barney. 

Na primeira tentativa eu queria ser jornalista investigativa e, na minha cabeça, isso era uma junção detetive+policial+mídia. Sou bem mais realista hoje em dia, vai.